segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Livro - Entrevistas com Arquitetos, Hanno Rauterberg



Finalmente terminei a leitura desse livro que esteve guardado na minha estante durante tanto tempo. O livro interroga 19 dos mais célebres arquitetos com assuntos imprescindíveis a profissão, se tornando uma verdadeira fonte de inspiração para os aprendizes mortais -
não por acaso é o primeiro livro sobre arquitetura que leio após estar oficialmente graduada.
O alemão Hanno Rauterberg, renomado crítico de arquitetura, conversa com os ilustres arquitetos da atualidade sobre o estado da arquitetura hoje em dia, suas aspirações, as influências em sua obra e se seus projetos podem mudar o mundo. Entre os entrevistados estão nomes de diferentes movimentos e lugares no mundo, como por exemplo: Norman Foster, Cecul Balmond, Peter Eisenman, Frank gehry, Zaha Hadid, Daniel Libekind, Oscar Niemeyer, entre outros.
A Introdução do livro, intitulada: 'Modernismo Digital, porque a arquitetura é mais popular do que nunca' faz um apanhado de questões importantes que aparecem em muitas das entrevistas: 'Seus projetos acrescentam o quê? Ainda existem Vanguardas? E será que podem transformar o mundo com sua arquitetura? Elas são apenas grandes esculturas, algo apenas para os de nível educacional elevado? Ou o que os visionários sonhavam no início do século 20 é realmente possível? Será que os arquitetos podem sensibilizar um grande número de pessoas, renovar cidades e até mesmo se tornarem um símbolo de mudança?'. As questões não são técnicas ou estéticas, elas abrangem sobretudo a  questão social - Para que estamos construindo?
Raunterberg ousa algumas provocações aos arquitetos em alguns momentos, como quando diz para a iraniana Zaha Hadid: 'The Times chamou-a de a mais odiada arquiteta da Inglaterra'. Quando diz que os prédios de Zaha 'têm algo preescritivo, mesmo que pareçam flexíveis', a iraniana parece perder a calma quando diz 'Você está querendo discutir?... Você provavelmente não gosta da minha arquitetura.'

É
um livro interessante para compreendermos questões indispensáveis à profissão, além disso, sem perder o profissionalismo e fugir de assuntos relacionados à arquitetura, o autor trás o lado mais humano dos arquitetos. Entre as respostas mais surpreendentes temos a de Oscar Niemeyer que ao ser perguntado se ainda existia alguma coisa que desejasse na vida, diz:
"Eu gostaria de parar de falar de arquitetura. Eu preferia falar sobre literatura, mulheres e ciência. Se me fosse concedido um desejo, então que todo mundo fosse igualmente próspero, por favor. que todo mundo fosse feliz. Atualmente, o mundo me parece terrivelmente desajustado. Há insatisfação por toda parte; muitas pessoas não acreditam no futuro; o dinheiro reina supremo. Até memso por essa única razão, a arquitetura não pode ser a resposa. A arquitetura não é importante, o mundo é importante, e nós temos que mudá-lo. Esse é um mundo de merda."

domingo, 17 de fevereiro de 2013

Documentário - Santiago, João Moreira Salles, 2007


Santiago (Santiago)
★★★★★
Brasil, 2007
João Moreira Sales


Em 1992, o cineasta João Moreira Salles, irmão de Walter Salles e filho do banqueiro e ex-ministro Walther Moreira Salles, empenhou-se em fazer um documentário sobre Santiago Badariotti Merlo, um mordomo, de origem italiana, dono de uma memória prodigiosa e vasta cultura que guardava nas lembranças o brilho das festas e recepções oferecidas pelo pai do realizador. Santiago trabalhou na casa da Gávea, a mansão de uma família muito rica e influente, onde o herdeiro dos Salles morou até os 20 anos e que hoje abriga o Instituto Moreira Salles, uma sede de referência para a fotografia e para a música no Rio de Janeiro.

O realizador percebeu a singularidade do homem já aposentado que viria a ser o personagem de seu filme em 1992. Santiago vive em um estreito apartamento do Leblon, no Rio de Janeiro, distante do esplendor dos luxuosos banquetes e grandes concertos que participara em um passado remoto. No seu humilde aposento leva uma vida solitária entre as 30 mil páginas que escreveu relatando os dramas e vidas de mais de 500 anos de nobrezas e dinastias de todo o mundo.

No mesmo ano, João Salles abandona o filme e só o retoma em 2005, entretanto, agora é ele quem se torna o protagonista. O filme é narrado em primeira pessoa, na voz do irmão, Fernando Moreira Salles e exibe todo o processo usado para fazer o filme em 1992. João explica detalhadamente como planejava construir o documentário apontando a câmera para Santiago e para a mansão onde o realizador cresceu. O documentarista descontruiu seu proprio documentário, revelando todos os cortes e desmascarando todos os seus mecanismos utilizados, sobretudo, como uma autocrítica do seu modo de conduzir o documentário década e meia atrás.

Em 2005, o resultado apresentado exprime a conscientização de um erro. Salles conseguiu retratar sua distância do antigo mordomo - ao que atribui suas inerentes posições de ex-patrão e ex-criado. O mordomo se apresenta como um personagem-objeto sempre ao fundo sendo constantemente manipulado no que dizer e como se posicionar. Toda essa errônea abordagem é explícita pelo diretor que usa o material completo que seria cortado na edição, os erros de Santiago durante as falas e  re-takes, enquanto a construção de seu material é questionada com a narração off feita pelo irmão, que indaga quanto à veracidade dos fatos que o documentário trás.

À vista disso, Santiago pouco se trata do ex-mordomo da família Salles. O documentarista trata do retrato de um erro, da consciência da perda de uma oportunidade única, já que não há mais como Salles reencontrar Santiago, que falecera logo depois das filmagens. Em 1992, quando teve a oportunidade, encarou-a com esteticismos e enquadramentos que quase perdiam Santiago ao fundo, não lhe dando a chance de expressar seus sentimentos e de ser ele mesmo na frente da câmera.

Santigo nunca foi o verdadeiro alvo da câmera, João Moreira Salles não procurava um personagem de seu passado para retratar, mas uma figura-chave que o guiasse para suas lembranças. O desejo de encontro com tudo que acontecera na casa da Gávea é buscado através do mordomo, um guia norteador que como ninguém, tinha vivo na memória um passado distante que jamais esquecera.